sábado, 26 de julho de 2014

Ariano Suassuna: Esquerda e Direita

Não concordo com a afirmação, hoje muito comum, de que não mais existem esquerda e direita. Acho até que quem diz isso normalmente é de direita.

Talvez eu pense assim porque mantenho, ainda hoje, uma visão religiosa do mundo e do homem, visão que, muito moço, alguns mestres me ajudaram a encontrar. Entre eles, talvez os mais importantes tenham sido Dostoiévski e aquela grande mulher que foi santa Teresa de Ávila.

Como consequência, também minha visão política tem substrato religioso. Olhando para o futuro, acredito que enquanto houver um desvalido, enquanto perdurar a injustiça com os infortunados de qualquer natureza, teremos que pensar e repensar a história em termos de esquerda e direita.

Temos também que olhar para trás e constatar que Herodes e Pilatos eram de direita, enquanto o Cristo e são João Batista eram de esquerda. Judas inicialmente era da esquerda. Traiu e passou para o outro lado: o de Barrabás, aquele criminoso que, com apoio da direita e do povo por ela enganado, na primeira grande “assembléia geral” da história moderna, ganhou contra o Cristo uma eleição decisiva.

Os Sertões

De esquerda eram também os apóstolos que estabeleceram a primeira comunidade cristã, em bases muito parecidas com as do pré-socialismo organizado em Canudos por Antônio Conselheiro. Para demonstrar isso, basta comparar o texto de são Lucas, nos “Atos dos Apóstolos”, com o de Euclydes da Cunha em “Os Sertões”.

Escreve o primeiro: “Ninguém considerava exclusivamente seu o que possuía, mas tudo entre eles era comum. Não havia entre eles necessitado algum. Os que possuíam terras e casas, vendiam-nas, traziam os valores das vendas e os depunham aos pés dos apóstolos. Distribuía-se, então, a cada um, segundo a sua necessidade”.

Afirma o segundo, sobre o pré-socialismo dos seguidores de Antônio Conselheiro: “A propriedade tornou-se-lhes uma forma exagerada do coletivismo tribal dos beduínos: apropriação pessoal apenas de objetos móveis e das casas, comunidade absoluta da terra, das pastagens, dos rebanhos e dos escassos produtos das culturas, cujos donos recebiam exígua quota parte, revertendo o resto para a companhia” (isto é, para a comunidade).

Concluo recordando que, no Brasil atual, outra maneira fácil de manter clara a distinção é a seguinte: quem é de esquerda, luta para manter a soberania nacional e é socialista; quem é de direita, é entreguista e capitalista. Quem, na sua visão do social, coloca a ênfase na justiça, é de esquerda. Quem a coloca na eficácia e no lucro, é de direita.

Por Ariano Suassuana
Reproduzido do MST

Carta para Ariano Suassuna

 / Foto: Globo/DivulgaçãoO ator Matheus Nachtergaele ganhou notoriedade após interpretar um dos mais emblemáticos personagens de Ariano Suassuna: João Grilo, em O Auto da Compadecida. Diante da situação de saúde delicada do escritor e dramaturgo, que está internado no Hospital Português após sofrer um AVC hemorrágico, Matheus voltou a se vestir de João Grilo para escrever uma carta para Ariano. Confira:

"Carta para Ariano,

Quem te escreve agora é o Cavalo do teu Grilo. Um dos cavalos do teu Grilo. Aquele que te sente todos os dias, nas ruas, nos bares, nas casas. Toda vez que alguém, homem, mulher, criança ou velho, me acena sorrindo e nos olhos contentes me salva da morte ao me ver Grilo. 

Esse que te escreve já foi cavalgado por loucos caubóis: Por Jó, cavaleiro sábio que insistia na pergunta primordial. Por Trepliev, infantil édipo de talento transbordante e melancólicas desculpas. Fui domado por cavaleiros de Sheakespeare, de Nelson, de Tchekov. Fui duas vezes cavalgado por Dias Gomes. Adentrei perigosas veredas guiado por Carrière, por Büchner e Yeats. Mas de todos eles, meu favorito foi teu Grilo.

O Grilo colocou em mim rédeas de sisal, sem forçar com ferros minha boca cansada. Sentou-se sem cela e estribo, à pelo e sem chicote, no lombo
dolorido de mim e nele descansou. Não corria em cavalgada. Buscava sem fim uma paragem de bom pasto, uma várzea verde entre a secura dos nossos caminhos. Me fazia sorrir tanto que eu, cavalo, não notava a aridez da caminhada. Eu era feliz e magro e desdentado e inteligente. Eu deixava o cavaleiro guiar a marcha e mal percebia a beleza da dor dele. O tamanho da dor dele. O amor que já sentia por ele, e por você, Ariano.

Depois do Grilo de você, e que é você, virei cavalo mimado, que não aceita ser domado, que encontra saídas pelas cêrcas de arame farpado, e encontra sempre uma sombra, um riachinho, um capim bom. Você Ariano, e teu João Grilo, me levaram para onde há verde gramagem eterna. Fui com vocês para a morada dos corações de toda gente daqui desse país bonito e duro. 

Depois do Grilo de você, que é você também, que sou eu, fui morar lá no rancho dos arquétipos, onde tem néctar de mel, água fresca e uma sombra brasileira, com rede de chita e tudo. De lá, vê-se a pedra do reino, uns cariris secos e coloridos, uns reis e uns santos. De lá, vejo você na cadeira de balanço de palhinha, contando, todo elegante, uma mesma linda estória pra nós. Um beijo, meu melhor cavaleiro. 

Teu,

Matheus Nachtergaele"

quinta-feira, 3 de julho de 2014

Décimo terceiro salário: direito de todo servidor

O décimo terceiro salário consiste na parcela contraprestativa paga pelo empregador ao empregado, em caráter de gratificação legal, no importe da remuneração devida em dezembro de cada ano ou no ultimo mês contratual, caso rompido o contrato.

O instituto inicialmente originou das normas autônomas (costume), sendo posteriormente incorporado pela legislação heterônoma estatal (Lei nº 4.090/1962), estendendo-se ao conjunto de leis que regulam o mercado de trabalho.

Todo trabalhador tem direito ao 13º salário, constitucionalmente previsto no artigo 7º, VIII, que estabelece o "décimo terceiro salário com base na remuneração integral ou no valor da aposentadoria".

A gratificação natalina tem natureza salarial, sendo direito de todos os trabalhadores e dever de todos os empregadores. Deve ser paga em duas frações, a primeira, até o mês de novembro e a segunda até o dia 20 de dezembro do respectivo ano.

A Carta Fundamental em seu artigo 39, §3º estendeu o beneficio do décimo terceiro salário a todos os servidores públicos. Logo, todos os servidores terão o direito de receber a gratificação natalina.

O percentual a ser pago é o determinado na Constituição Federal, ou seja, será calculado com base na remuneração integral, que equivale ao vencimento acrescido das vantagens pecuniárias. É o vencimento básico mais as demais vantagens que o servidor faz jus.

Assim, o décimo terceiro salário deve ser pago ao servidor com base na remuneração integral (vencimento mais as vantagens) em duas parcelas sendo que a segunda tem como prazo máximo dia 20 de dezembro.

Por ter natureza salarial, o décimo terceiro salário é protegido pela Constituição Federal , no artigo 7º, X, que estabelece como crime sua retenção dolosa, podendo o empregador ser responsabilizado por crime de apropriação indébita, e sendo o empregador o Município, enquadrado na Lei de Responsabilidade Fiscal, Lei 101/2000.

É importante ressaltar que conforme mencionado acima o décimo terceiro salário é devido a todos os trabalhadores, sem exclusão de qualquer categoria. Assim, os empregados contratados pela Administração Pública fazem jus ao percebimento da gratificação natalina, que deverá ser paga integralmente se trabalharem o ano todo ou proporcionalmente aos meses contratuais laborados no ano.

Destarte, todos os trabalhadores, servidores e contratados fazem jus ao percebimento do décimo terceiro salário que deverá ser pago com base na remuneração integral (vencimento acrescido de todas as vantagens) e impreterivelmente até o dia 20 de dezembro do respectivo ano.

* Artigo de autoria de dra. Fernanda Adriana de Paula - OAB-MG 115808.